Nos
períodos que correspondem a dezembro de 2018 e janeiro de 2019, eu, Anderson
Aparecido Santos da Silva, estudante do 3° ano do curso de Geografia da UFGD
passei as minhas férias com a família no munícipio de São Paulo, cidade no qual
eu nasci, fui criado e passei a maior parte da minha vida, experimentando as
mais diversas experiências, além de momentos bons e ruins que a mesma me
proporcionou ao longo deste tempo. Vivendo em um bairro da região leste da
cidade, São Mateus, que é considerado um bairro de periferia, pelo fato de se
localizar em uma área longe das áreas tidas “valorizadas” e do centro da cidade.
Residindo em Dourados há mais de um ano (desde
do período de 2017 que foi quando eu iniciei no curso de geografia da UFGD),
sempre passei as férias de fim de ano em São Paulo – capital, sendo que dessa
vez eu fiquei um período muito maior em casa se comparado com as férias de 2017
-2018, me possibilitando de enxergar transformações e mudanças que não havia
percebido anteriormente.
Ao
voltar para São Paulo, logo de cara, me deparo com uma cidade com mais prédios
e arranha-céus em lugares que antes não existiam, se tornando uma cidade mais
verticalizada, se comparado com a minha última visita. Me deparo também com um
bairro que até então, era conhecido
pelas suas áreas de proteção permanente, se tornar mais urbano, com mais
pessoas, com mais comércios e serviços que antes não costumava ser oferecido,
mas, o que me chamou mais a atenção nesse período não foi o aumento da
verticalização ou crescimento de um bairro considerado ainda por muitos
“periféricos” mas sim a contradição de uma cidade que investiu nos últimos dois
anos na revitalização de pontos turísticos do centro da cidade, expulsando diversos
moradores de rua da área central da cidade, pessoas essas que, sem sobra de
dúvida são as mais vulneráveis dessa metrópole
conhecida como a selva de pedra. Nesse meio tempo, notei também o
expressivo aumento do policiamento desta área, tornando os moradores de rua os
seus principais alvos.
Além
disso, secretarias da prefeitura que cuidava de temas ligados aos direitos
humanos e ao público LGBT e dos moradores de rua foram simplesmente fechadas
pela atual gestão, pelo fato de considerarem estes temas “desnecessários,”
tornando o mesmo, assuntos de menor importância. Nesse tempo em que fiquei em
São Paulo, ficou nítido que a cidade investiu pesado na revitalização áreas
como a região da Praça da Sé, da 25 de março, da estação da luz, do Bom Retiro,
além de algumas outras áreas, com o intuito de de tornar a cidade mais atraente para turistas
e investidores, empregando a clara política de “city Marketing”. De fato,
alguns pontos turísticos como o memorial da resistência e a Pinacoteca do
Estado (que se localizam próxima a estação da Luz) receberam reformas de
manutenção, suportando a entrada de mais obras e esculturas, dando espaços para
mostras até então inédita na cidade, como a que está ocorrendo no memorial da
resistência, que conta a história de São Paulo antes da chegada dos colonizadores.
É
interessante ver uma cidade receber turistas de outros países, é interessante
ver outras línguas sendo faladas no meio da região central da cidade, mas ao
mesmo tempo é deprimente ver uma cidade que enaltecer o turista americano ou
Europeu que está fazendo turismo em São Paulo, mas que ao mesmo tempo, despreza
e marginaliza o imigrante Boliviano, Venezuelano, Haitiano e de diversas outras
partes do continente Latino Americano e/ou do continente Africano que se mudam
para São Paulo com o objetivo de alcançar um patamar de vida melhor para ele e
para a sua família.
Me
entristece perceber que a cidade, apesar de estar mais bela do que nunca, ter
se tornado menos humana em detrimento de uma lógica econômica que beneficia
poucos. Percebi também que as pessoas residentes de bairros como o de São
Mateus, cidade Tiradentes e tantos outros que nasceram da luta dos
marginalizados e negligenciados que lutaram pelo seu direito à cidade, pelo
direito de uma moradia digna, pelo direito de existir enquanto cidadão, serem
engolidos pela lógica capitalista que sobrepõe o valor de troca sobre o valor
de uso da terra urbana e da moradia, e pior, as pessoas residentes destes
mesmos bairros, comprarem esta ideia, deixando de lado todo o seu histórico de
luta e resistência, acreditando ser isso o realmente certo a se fazer e se
seguir.
A
volta pra casa desta vez não foi nostálgica, não teve o impacto da primeira
vez, de fato, com o tempo a pessoa se habitua com esse ir e vir, sem deixar de
lado o carinho e as lembranças afetivas que o identificam enquanto morador,
seja de um bairro e/ou de uma cidade, Mas é difícil voltar para a sua cidade de
origem e perceber que atividades tão comuns para você como visitar museus ir ao
cinema, conhecer outras cidades e estados e cursar uma universidade pública,
gratuita e de qualidade, mesmo que seja em outro estado ou cidade, seja algo
como uma realidade tão distantes e até mesmo desnecessário para amigos e pessoas que cresceram e passaram uma parte importante
da sua vida ao seu lado, seja como
vizinho, amigo de escola ou até mesmo de trabalho, nesse momento a gente
percebe que o exílio na periferia continua bastante vivo e avançando cada vez
mais.
Pela
primeira vez, me senti como um estranho em minha própria cidade e no meu
bairro, percebi o quanto eu mudei a forma de enxergar o mundo a minha volta,
mudando o jeito de analisar os fatos e a realidade que me cerca. É triste
perceber que as pessoas a sua volta não percebem o quanto a cidade mudou, só
que para pior, é triste perceber que seu amigos e até mesmo alguns de seus
parentes e pessoas próximas foram afetadas pela histeria e ódio coletivo,
gerado por um discurso ultraconservador e neoliberal que desconsidera toda a
humanidade em detrimento de objetivos tão egoístas como o lucro e o acúmulo de
objetos supérfluos que farão pouca diferença na sua vida. Eu acredito que como
tudo na vida, isso um dia também irá passar, pois nada na vida é pra sempre,
até mesmo essa loucura na qual o Brasil vem passando também irá passar. Espero
e torço para ver uma São Paulo mais humana, uma São Paulo que dê importância
não só para os turistas como também para aqueles que buscam uma vida melhor, ou
até mesmo aqueles que são deixados à própria sorte nas ruas da capital.
enquanto isso faço o possível e o impossível para que as pessoas em minha volta
não sejam levadas por essa onda de ódio e de histeria coletiva.
PETiano: Anderson Aparecido (Cidão)